sexta-feira, 7 de agosto de 2020

CDC não é aplicável a atendimento custeado pelo SUS em hospitais privados conveniados

​​A Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiu que problemas relacionados ao atendimento médico custeado pelo Sistema Único de Saúde (SUS) em hospitais privados não estão sujeitos ao Código de Defesa do Consumidor (CDC), mas sim às regras que tratam da responsabilidade civil do Estado.

Com a decisão, a turma rejeitou o recurso no qual dois profissionais condenados por erro médico sustentavam ter ocorrido a prescrição do processo, já que, não havendo relação de consumo no caso, mas prestação de serviço público, seria aplicável o prazo prescricional de três anos estabelecido no artigo 206, parágrafo 3º, V, do Código Civil (CC/2002), em vez do de cinco anos previsto no CDC.   

O colegiado concluiu, porém, que o prazo é mesmo de cinco anos, pois o direito de obter indenização pelos danos causados por agentes de saúde vinculados às pessoas jurídicas que atuam como prestadoras de serviços públicos – quando elas são remuneradas pelo SUS – submete-se à prescrição regida pelo artigo 1º-C da Lei 9.494/1997.

Erro médico

O caso analisado pela turma teve origem em ação de compensação por dano moral ajuizada por uma mulher contra três médicos, em virtude de erro médico que teria causado a morte de seu neto, à época com um ano e 11 meses de idade. Segundo relatado pela avó, o menino, picado por um inseto, foi atendido em hospital particular conveniado ao SUS, onde teria recebido tratamento indevido.

Condenados em primeira instância, os réus apelaram sob a alegação de que o caso já estaria prescrito, mas o Tribunal de Justiça de Santa Catarina entendeu que o prazo de prescrição seria de cinco anos, nos termos do artigo 27 do CDC.

Ao STJ, dois dos três réus alegaram a inaplicabilidade do CDC a suposto erro médico em atendimento do SUS, tendo em vista não haver nenhuma forma de remuneração ou contratação do profissional pelo paciente, e defenderam a incidência da prescrição regulada pelo Código Civil.

Função púb​lica

A ministra relatora, Nancy Andrighi, afirmou que a participação complementar da iniciativa privada na execução de ações e serviços de saúde, admitida pela Constituição, se formaliza por meio de contrato ou convênio com a administração pública – como disposto nas Leis 8.080/1990 e 8.666/1990 –, sendo remunerada com base na tabela de procedimentos do SUS, editada pelo Ministério da Saúde.

"Não há dúvidas de que, quando prestado diretamente pelo Estado, no âmbito de seus hospitais ou postos de saúde, ou quando delegado à iniciativa privada, por convênio ou contrato com a administração pública, para prestá-lo às expensas do SUS, o serviço de saúde constitui serviço público social", apontou a relatora.

Nancy Andrighi salientou que há entendimento do STJ no sentido de que o hospital privado conveniado que exerce atividade de relevância pública – recebendo, como contrapartida, pagamento dos cofres públicos – desempenha função pública. Em igual situação, avaliou, encontra-se o médico que atua com remuneração proveniente de recursos estatais.

A ministra também ressaltou que, na esfera criminal, tanto a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal quanto a do STJ estão orientadas no sentido de que os profissionais da saúde que atuam nessas circunstâncias equiparam-se ao funcionário público.

Indivisível e uni​​​versal

De acordo com a relatora, para apuração de responsabilidades em situações como a dos autos, tanto no âmbito civil quanto no criminal, deve-se considerar que o ato ilícito foi praticado no exercício de uma função pública e avaliar se o serviço é prestado de forma singular (uti singuli) ou universal (uti universi).

A ministra explicou, citando a doutrina, que os serviços uti singuli são prestados de forma divisível e singular, remunerados diretamente por quem deles se utiliza, em geral por meio de tarifa. Já os serviços uti universi são prestados de forma indivisível e universal, custeados por meio de impostos.

"Diante desse cenário, caracterizando-se a participação complementar da iniciativa privada – seja das pessoas jurídicas, seja dos respectivos profissionais – na execução de atividades de saúde como serviço público indivisível e universal (uti universi), há de ser, por conseguinte, afastada a incidência das regras do CDC", disse a ministra.

Natur​​​eza especial

Nancy Andrighi concluiu que, afastada a incidência do CDC, em relação à prescrição é aplicável o prazo de cinco anos previsto na Lei 9.494/1997, orientação já definida pelas turmas que compõem a Segunda Seção do STJ como a mais adequada para a solução de litígios relacionados ao serviço público, sob qualquer enfoque.

Ela destacou ainda que o prazo, que tem natureza especial – com destinação específica aos danos causados por agentes de pessoas jurídicas de direito público ou privado prestadoras de serviços públicos –, não foi revogado, expressa ou tacitamente, pelo artigo 206, parágrafo 3º, V, do Código Civil, que possui natureza geral.

Apesar de afastar a incidência do CDC nos autos, a relatora entendeu que não seria o caso de reconhecimento de prescrição, porque a ação de compensação por danos morais foi ajuizada antes do prazo de cinco anos previsto no artigo 1º-C da Lei 9.494/1997.

Leia o acórdão.

Fonte: http://www.stj.jus.br/sites/portalp/Paginas/Comunicacao/Noticias/06082020-CDC-nao-e-aplicavel-a-atendimento-custeado-pelo-SUS-em-hospitais-privados-conveniados.aspx

Mesmo sem trânsito em julgado, condenação penal pode amparar direito a indenização na esfera cível

​Para a Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), o reconhecimento da existência de um crime e do seu autor em sentença condenatória penal, ainda que não tenha havido o trânsito em julgado do processo, pode amparar a condenação em ação indenizatória na esfera cível.

Com base nesse entendimento, o colegiado reformou acórdão do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP) para reconhecer o direito da mãe de uma vítima de homicídio de ser indenizada na esfera cível.

A autora da ação indenizatória pediu a condenação do acusado pelo homicídio ao pagamento de R$ 500 mil por danos morais, mas o juiz fixou a reparação em R$ 100 mil.

O TJSP, contudo, deu provimento à apelação do réu para julgar improcedente o pedido inicial. Para a corte paulista, é controversa a iniciativa da agressão física no episódio que resultou no homicídio, pois, além de não haver testemunhas, o réu sempre alegou legítima defesa e apontou a existência de comportamento agressivo por parte da vítima. Consta dos autos, ainda, que a vítima ameaçou e agrediu a filha do réu, que estava grávida.

Independ​ência relativa

O ministro Villas Bôas Cueva, relator do recurso especial apresentado pela mãe da vítima, apontou que o artigo 935 do Código Civil adotou o sistema da independência entre as esferas cível e criminal, mas que tal independência é relativa, pois, uma vez reconhecida a existência do fato e da autoria no juízo criminal, essas questões não poderão mais ser analisadas pelo juízo cível.

No caso de sentença condenatória com trânsito em julgado – explicou o ministro –, o dever de indenizar é incontornável; no caso de sentença absolutória em virtude do reconhecimento de inexistência do fato ou de negativa de autoria, não há o dever de indenizar. Segundo o relator, o caso não se encaixa em nenhuma dessas hipóteses, pois a sentença condenatória não é definitiva.

"Não havendo sentença condenatória com trânsito em julgado, devem-se avaliar os elementos de prova para aferir a responsabilidade do réu pela reparação do dano", afirmou.

Repro​​vabilidade

Villas Bôas Cueva assinalou que o réu foi condenado por homicídio privilegiado, e mesmo que tenha alegado legítima defesa na esfera cível, essa excludente de ilicitude não foi reconhecida no juízo criminal – "esfera que, em regra, analisa de forma mais aprofundada as circunstâncias que envolveram a prática do delito". Nem mesmo o eventual reconhecimento da legítima defesa na sentença penal, de acordo com o ministro, impediria o juízo cível de avaliar a culpabilidade do réu.

Para o relator, não se podem negar a existência do dano sofrido pela mãe nem "a acentuada reprovabilidade da conduta do réu", o qual procurou a vítima em sua casa na data do crime. Ainda que a vítima apresentasse comportamento agressivo e que tenha havido luta corporal, como alega o réu, tais fatos – disse o ministro – não afastam o dever de indenizar, "sobretudo quando todas as circunstâncias envolvendo o crime já foram objeto de apreciação no juízo criminal, tendo este concluído pela condenação".

No entanto, considerando a agressividade da vítima – especialmente os atos praticados contra a filha e outros familiares do réu –, a Terceira Turma fixou a indenização em R$ 50 mil.

Leia o acórdão.

Fonte: http://www.stj.jus.br/sites/portalp/Paginas/Comunicacao/Noticias/07082020-Mesmo-sem-transito-em-julgado--condenacao-penal-pode-amparar-direito-a-indenizacao-na-esfera-civel.aspx

Contribuição patronal sobre salário-maternidade é inconstitucional

Segundo a maioria do Plenário, a parcela não é contraprestação ao trabalho e, portanto, não pode compor a base de cálculo.

O Supremo Tribunal Federal (STF) declarou a inconstitucionalidade de dispositivos da Lei Orgânica da Seguridade Social (Lei 8.212/1991) que instituíam a cobrança da contribuição previdenciária patronal sobre o salário-maternidade. A decisão, por maioria de votos, foi tomada no Recurso Extraordinário (RE) 576967, com repercussão geral reconhecida (Tema 72), julgado na sessão virtual encerrada em 4/8. A decisão servirá de parâmetro para a resolução de, pelo menos, 6970 processos semelhantes sobrestados em outros tribunais.

O recurso foi interposto pelo Hospital Vita Batel S/A, de Curitiba (PR), com o argumento de que o salário-maternidade não pode ser considerado como remuneração para fins de tributação, pois, no período em que o recebe, a empregada está afastada do trabalho. A empresa sustentava que a utilização da parcela na base de cálculo para fins de cobrança previdenciária caracterizaria fonte de custeio para a seguridade social não prevista em lei. A União, por outro lado, alegava que a empregada continua a fazer parte da folha de salários mesmo durante o afastamento e que, pela lei, o salário-maternidade é considerado salário de contribuição.

O exame do caso havia sido iniciado em novembro de 2019 e foi suspenso por pedido de vista do ministro Marco Aurélio, que liberou o processo para continuidade de julgamento em ambiente virtual, em razão da pandemia da Covid-19.

Contraprestação

No voto condutor da decisão, o relator do RE, ministro Luís Roberto Barroso, destacou que a Constituição Federal e a Lei 8.212/1991 preveem como base de cálculo da contribuição previdenciária os valores pagos como contraprestação a trabalho ou serviço prestado ao empregador, empresa e entidade equiparada. No caso da licença-maternidade, no entanto, a trabalhadora se afasta de suas atividades e deixa de prestar serviços e de receber salários do empregador. Portanto, o benefício não compõe a base de cálculo da contribuição social sobre a folha salarial. “O simples fato de que a mulher continua a constar formalmente na folha de salários decorre da manutenção do vínculo trabalhista e não impõe natureza salarial ao benefício por ela recebido”, ressaltou.

O relator salienta que a regra questionada (artigo 28, parágrafo 2º, da Lei 8.212/1991) cria, por lei ordinária, nova fonte de custeio da seguridade social diversa das previstas na Constituição Federal (artigo 195, inciso I, alínea ‘a’). De acordo com a norma constitucional, a criação de outras fontes destinadas a garantir a manutenção ou a expansão da seguridade social exige a edição de lei complementar.

Discriminação da mulher no mercado de trabalho

Barroso destacou diversas pesquisas que demonstram a reiterada discriminação das mulheres no mercado de trabalho, com restrições ao acesso a determinados postos de trabalho, salários e oportunidades. Um estudo da Organização Internacional do Trabalho (OIT) citado por ele concluiu que, no Brasil, os custos adicionais para o empregador correspondem a 1,2% da remuneração bruta mensal da mulher.

Para o relator, admitir uma incidência tributária que recaia somente sobre a contratação de mulheres e mães é tornar sua condição biológica, por si só, um fator de desequiparação de tratamento em relação aos homens, desestimulando a maternidade ou, ao menos, incutindo culpa, questionamentos, reflexões e medos em grande parcela da população, pelo simples fato de ter nascido mulher. “Impõe-se gravame terrível sobre o gênero feminino, discriminado na contratação, bem como sobre a própria maternidade, o que fere os direitos das mulheres, dimensão inequívoca dos direitos humanos”, afirmou.

Repercussão geral

Por maioria, foi declarada, incidentalmente, a inconstitucionalidade da incidência de contribuição previdenciária sobre o salário-maternidade, prevista no artigo 28, parágrafo 2º, da Lei 8.212/1991, e a parte final do seu parágrafo 9º, alínea ‘a’, em que se lê “salvo o salário-maternidade”. O entendimento do relator foi seguido pelos ministros Edson Fachin, Rosa Weber, Luiz Fux, Cármen Lúcia, Marco Aurélio e Celso de Mello. Ficaram vencidos os ministros Alexandre de Moraes, Ricardo Lewandowski, Gilmar Mendes e Dias Toffoli, que negavam provimento ao RE.

A tese de repercussão geral fixada foi a seguinte: “É inconstitucional a incidência de contribuição previdenciária a cargo do empregador sobre o salário-maternidade”.

PR/AS//CF

Fonte: http://portal.stf.jus.br/noticias/verNoticiaDetalhe.asp?idConteudo=449079&ori=1

quinta-feira, 25 de junho de 2020

NOTA OFICIAL - OAB/RS


A Ordem dos Advogados do Brasil, Seccional do Rio Grande do Sul, tendo presente seu papel institucional, especialmente evidenciado na Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, expressa sua preocupação com a instabilidade das relações jurídicas e sociais no Estado do Rio Grande do Sul, diante da manutenção da cessação das atividades presenciais e da tramitação dos processos físicos do Poder Judiciário do Estado do Rio Grande do Sul, principalmente porque tal decisão afeta também as regiões com bandeiras amarela e laranja, nas quais vários serviços, até os que não são considerados essenciais, seguem funcionando quase que de forma normal.

É fato notório o grande volume de litígios que tramitam na Justiça Estadual e, igualmente, que sua imensa maioria, aproximadamente 80%, ainda tramita sob a forma de processos físicos, ao contrário do que ocorre em muitos outros Estados.

Diante dessa realidade e especialmente considerando que não foi adotado no Estado do Rio Grande do Sul o regime de lockdown por conta da pandemia de Coronavírus, causa perplexidade e inconformidade que um serviço essencial dessa magnitude, pelo qual se tutelam direitos das mais variadas naturezas e grandezas, permaneça com a tramitação dos processos físicos suspensos e com serviços prestados exclusivamente sob a forma remota.

Há inúmeros exemplos de serviços públicos que seguem sendo prestados com as cautelas necessárias para preservar a saúde tanto dos servidores quanto dos usuários e beneficiários do serviço, com redução de pessoal, turnos e horários alternados, distanciamento e utilização de equipamentos de proteção individual, além de higienização de espaços compartilhados e intervalos para contato com documentos. A notoriedade de um cargo público exige a consciência de que antes dos interesses individuais se deve preservar os interesses da coletividade, se deve atender à população destinatária do serviço.

Todas as medidas visando resguardar a saúde, desde que mantida razoável continuidade no serviço, devem ser louvadas, e assim tem procedido a Seccional da Ordem dos Advogados do Brasil, colaborando e apoiando medidas que, ao tempo em que seguem as devidas cautelas sanitárias, não descuidam da continuidade do serviço.

Entretanto, manter as instalações físicas do Poder Judiciário completamente fechadas, com entraves e postergação à prática de atos processuais, até mesmo dificultando o percentual de processos eletrônicos, bem como permanecer suspensa a tramitação de processos físicos num quadro de pandemia ainda controlado no Estado nos leva à conclusão de que é postergada a realização de direitos da cidadania que são pleiteados em Juízo, situação com a qual não podemos concordar.

O constituinte consignou a essencialidade da função do advogado para o sistema de justiça e atribuiu a ele múnus público, de modo que a OAB/RS, enquanto sua entidade representativa, tem o dever de externar posição que preserve a saúde em toda sua amplitude tanto da advocacia quanto de todos os titulares de direitos por ela representados que aguardam a efetiva prestação jurisdicional. Postura esta que certamente significa defender que sejam reabertas as serventias judiciais gaúchas, com as devidas cautelas sanitárias, pelo menos para que sejam digitalizados em regime de urgência os processos físicos, especialmente considerando que não está em vigência medida nem estadual nem municipal que imponha restrições à livre locomoção de pessoas (lockdown).

DIRETORIA DA OAB/RS.

Fonte: https://www.oabrs.org.br/mobile/noticias/nota-oficial/44674

quarta-feira, 10 de junho de 2020

Justiça determina reativação de conta em rede social


Perfil de usuária sofreu bloqueio injustificado.

 

  A 45ª Vara Cível Central julgou procedente ação contra bloqueio indevido do perfil de usuária no Instagram.  A rede social administradora foi sentenciada ao pagamento de R$ 6 mil, além da obrigação de reativar a conta. 

De acordo com os autos, a autora trabalhava como jornalista e influencer digital por meio do perfil criado no Instagram. Subitamente e sem justificativas, a conta foi excluída pela administradora da rede social, o que prejudicou o andamento de trabalhos desenvolvidos pela requerente.

Em sua decisão, o juiz Guilherme Ferreira da Cruz ressalta que “sabe-se, todavia, que a conta da autora ficou temporariamente indisponível, a tornar irrelevante a dúvida que se tentou plantar quanto ao suposto equívoco durante o procedimento de recuperação, superado o entrave apenas após a intimação da ordem concedida”. Para o magistrado, não se sustentou ainda a tese alegada pela ré de exercício regular de direito ao bloquear a conta da usuária, visto que a empresa sequer mencionou qual política teria sido violada pela requerente.

O fato de a ação ter sido distribuída em 9/5 e a sentença ter sido proferida em 9/6, com concessão de liminar, contestação e réplica nesse intervalo, é mostra da bem-sucedida adaptação do TJSP ao isolamento social, afirma o magistrado. “A demanda tramitou normalmente dentro do período de pandemia, a revelar a total eficiência do sistema de ‘home office’, comprometido o Poder Judiciário Bandeirante com as inovações da tecnologia, que não admitem e/ou comportam retrocesso”, destacou Guilherme Ferreira da Cruz.

  Processo nº 1038694-17.2020.8.26.0100

Fonte: http://www.tjsp.jus.br/Noticias/Noticia?codigoNoticia=61306&pagina=1

segunda-feira, 8 de junho de 2020

Congresso inicia debate sobre lei para reformar sistema policial dos EUA

Proposta proíbe estrangulamentos, e facilita a punição de policiais acusados de má conduta

WASHINGTON | REUTERS

O Congresso dos Estados Unidos começou a debater, nesta segunda-feira (8), um projeto de lei com o objetivo de reformar o sistema policial americano, em resposta a algumas das demandas dos protestos que se espalharam pelo país após a morte de George Floyd.

A proposta de legislação, elaborada por membros do Partido Democrata na Câmara e no Senado americanos, cria um registro nacional sobre a má conduta policial e torna mais fácil processar os agentes acusados de más práticas.

Além disso, o projeto de lei proíbe estrangulamentos e outras táticas de abordagem violenta, como a utilizada pelo policial responsável pela morte de Floyd.

A presidente da Câmara, Nancy Pelosi, o líder da minoria democrata no Senado, Chuck Schumer, a senadora Kamala Harris, e outros congressistas do Partido Democrata, fizeram um tributo à Floyd no início da tarde desta segunda-feira (7), antes de iniciarem a discussão sobre as reformas.

"Está na hora de mudar a cultura da polícia em muitos departamentos por todo o país", disse a congressista democrata Karen Bass, uma das autoras do projeto, em uma publicação no Twitter.

Para Bass, a onda de manifestações, que voltou a ser pacífica depois de uma escalada de violência, aumentou a pressão sobre os legisladores para agir.

"A paixão que as pessoas estão demonstrando [nos protestos] vai lançar as bases para o momento de promovermos a mudança que precisamos fazer", disse, em entrevista à CNN.

Para que a lei seja aprovada, entretanto, serão necessários os apoios dos republicanos, que são maioria no Senado americano, e do presidente Donald Trump.

Outro ponto-chave da proposta que será apresentada pelos democratas é o fim da "imunidade qualificada", espécie de excludente de ilicitude que oferece respaldo legal a policiais quando alguém morre sob sua custódia.

O secretário de Justiça dos EUA, William Barr, afirmou, neste domingo (7), que qualquer medida no sentido de reduzir a imunidade dos policiais não receberá seu apoio.

Barr também disse que não acha que o racismo é um problema sistêmico na polícia americana, embora tenha reconhecido que "durante a maior parte da história, as instituições americanas foram explicitamente racistas".

A mensagem comum das manifestações antirracismo nos EUA foi a determinação de transformar a indignação gerada pela morte de Floyd em um movimento mais amplo, buscando reformas de longo alcance no sistema de justiça criminal americano e no tratamento dado a minorias sociais.


Em Minneapolis, palco dos primeiros protestos e cidade onde Floyd foi assassinado, 9 dos 13 membros do Conselho Municipal se comprometeram, neste domingo (7), a abolir o Departamento de Polícia e criar um novo sistema de segurança púbica liderado pela comunidade.

Na cidade de Nova York, o prefeito Bill de Blasio também prometeu reverter parte do orçamento da polícia a serviços sociais.

"Estamos comprometidos em ver uma mudança de financiamento em serviços para a juventude e em serviços sociais, que acontecerá, literalmente, nas próximas três semanas, mas não vou entrar em detalhes porque [a mudança] está sujeit a negociação e nós queremos descobrir o que faz sentido.”

O prefeito não informou exatamente qual é a quantia que ele planeja retirar dos US$ 6 bilhões ( R$ 29,7 bi) anuais destinados à polícia de Nova York, mas disse que os detalhes serão apresentados em 1º de julho, prazo final do orçamento da administração municipal.

Na sexta-feira (6), Andrew Cuomo, governador do estado, disse que vai aprovar um conjunto de reformas que incluem a disponibilização pública de registros disciplinares da polícia, a proibição de estrangulamentos e a criminalização de chamadas de emergência à polícia baseadas em aspectos raciais de possíveis suspeitos.

No estado da Califórnia, o governador, Gavin Newsom, disse que impediria uma agência estadual de treinamento da polícia de ensinar uma técnica de contenção que envolve a restrição da artéria carótida, responsável pela circulação de sangue na cabeça.

A técnica deixa a vítima inconsciente e pode levar à morte, como no caso de Floyd.

Aos 46 anos, Floyd, homem negro, foi abordado por quatro policiais em Minneapolis, depois que o atendente de uma loja acionou os agentes acusando Floyd de tentar passar uma nota falsa de US$ 20 dólares.

Mais tarde, a versão dos policiais foi de que Floyd ofereceu resistência. O vídeo que viralizou nas redes sociais e serviu de gatilho para os protestos em várias cidades do mundo mostra, entretanto, um dos policiais, Derek Chauvin, usando o joelho para pressionar o pescoço de Floyd contra o chão por quase nove minutos.

De acordo com as imagens, Chauvin ignorou os avisos de Floyd, de que não estava conseguindo respirar, e os apelos das testemunhas, que apontavam uso excessivo de força.

Os quatro policiais foram demitidos assim que o caso veio à tona. Chauvin agora está sendo acusado de homicídio em segundo grau, o equivalente a homicídio doloso, quando há intenção de matar). Ele pode pegar até 40 anos de prisão. Os outros três policiais que acompanharam a abordagem foram indiciados como cúmplices.

Nesta segunda (8), Chauvin deve comparecer à corte que conduzirá seu julgamento. Será sua primeira aparição pública desde que ele foi preso e transferido para uma prisão de segurança máxima, considerada a mais segura do estado de Minnesota.

A ampliação das acusações contra os policiais parece ter sido o fator que interrompeu a escalada de violência dos protestos contra a morte de Floyd.

Durante a primeira semana de manifestações, foram registrados incêndios em carros e prédios, saques em lojas e conflitos com policiais em centenas de cidades americanas.

Nos últimos dias, entretanto, os atos seguem, em sua maioria, pacíficos. A exceção neste domingo (7) foi um homem que dirigiu seu carro contra uma multidão que se manifestava em Seattle, no estado de Washington.

Em seguida, o motorista atirou contra um dos manifestantes, saiu correndo e se entregou a polícia. De acordo com autoridades locais, o homem baleado foi levado ao hospital em condições estáveis, e ninguém mais ficou ferido.

Neste domingo (7), Trump ordenou a retirada das tropas da Guarda Nacional de Washington, mas disse que "elas podem retornar rapidamente, se necessário".

A Guarda Nacional foi acionada por quase todos os estados americanos na tentativa de reforçar o apoio às forças de segurança locais para conter protestos violentos e garantir o cumprimento dos toques de recolher estabelecidos em grande parte das mais de 700 cidades onde foram registradas manifestações, de acordo com um levantamento do jornal americano USA Today.

Fonte: https://www1.folha.uol.com.br/amp/mundo/2020/06/congresso-inicia-debate-sobre-lei-para-reformar-sistema-policial-dos-eua.shtml?utm_source=twitter&utm_medium=social&utm_campaign=twfolha&__twitter_impression=true

Família de preso que morreu dentro da cadeia por conta de descarga elétrica será indenizada pelo Estado de Goiás

O Estado de Goiás foi condenado a pagar indenização por danos morais de R$ 60 mil à mulher e três filhos de um homem que estava preso no estabelecimento prisional do Município de Anápolis e morreu dentro da unidade, enquanto realizava serviços de manutenção elétrica, quando sofreu uma descarga. Conforme a sentença da juíza Mônice de Souza Balian Zaccariotti, da Vara da Fazenda Pública Estadual da comarca local, cada um receberá o valor de R$ 15 mil reais.

Quanto aos lucros cessantes em favor dos autores, de forma solidária, a magistrada fixou no valor total correspondente a 2/3 do salário mínimo, sendo devido aos filhos até a data em que estes completem 25 anos e, à cônjuge, até a data em que o falecido completaria 75 anos.

Mulher e filhos sustentaram que o homem encontrava-se inserido no estabelecimento prisional de Anápolis e, no dia 17 de outubro de 2017, dentro do presídio estadual, enquanto realizava serviços de instalações elétricas, sofreu uma descarga, o que culminou em sua morte. Alegam que o Estado não cumpriu o seu papel social de zelar pela integridade do falecido. Por sua vez, o Estado de Goiás alegou a inexistência de comprovação de que o evento danoso se deu por sua omissão, assim como que a morte decorreu por culpa exclusiva do preso.

Omissão específica

A magistrada entendeu que este caso se emolda na definição de omissão específica, “uma vez que como cediço, o Estado possui o dever constitucional de garantir aos presos “o respeito e a integridade física e moral – Constituição Federal, artigo 5º, XLIX”. Para ela, é evidente que o falecido foi vítima de uma descarga elétrica, enquanto exercia funções de instalação elétrica, no interior do presídio de Anápolis, “consoante se denota das notícias juntadas” ao processo.

Conforme salientou a juíza Mônice de Souza Balian Zaccariotti, restou comprovado o nexo causal entre o evento danoso (morte da vítima) e a omissão do ente público, no tocante à adequada proteção do detento, o que ocasionou a morte de seu tutelado, razão pela qual encontra-se configurada a responsabilidade do Estado de Goiás. “Ademais, entendo que não é razoável se presumir que a morte do detento decorreu de atividades clandestinas no interior do presídio, haja vista que ausente de qualquer suporte probatório e, mesmo que comprovado, não seria capaz de, por si só, excluir a responsabilidade pelo dever de tutela do Estado”, concluiu a magistrada. Processo nº 5047552.02.2018.8.09.0006. (Texto: Lílian de França – Centro de Comunicação Social do TJGO)